A mídia e a família
A mídia tem servido para separar e unir pessoas da mesma família. Une no sentido de trazê-las para dentro de casa e retê-las em casa diante da tela dos programas de TV. Mas, ao mesmo tempo, separa-as, porque ou as deixa em silêncio em frente do aparelho criador de sonhos ou isola-as em quartos separados. Há casas com mais de um televisor de modo que as pessoas veem simultaneamente programas diferentes em lugares também distintos. Estão somente fisicamente sob o mesmo teto. Afetiva e culturalmente habitam mundos outros.
As distâncias interiores crescem independentemente das lonjuras físicas. Vive-se um misto esquisito de presença e solidão, de atividade e passividade, de carga afetiva e frieza eletrônica, de paixão e indiferença. Enquanto uns sofrem, comprometem-se com o universo imagético de amores e contactos, outros defendem-se, isolam-se, talvez até zombem dos apaixonados iludidos.
A cultura midiática data de nossos dias. Ainda não sabemos trabalhá-la bem, porque não conhecemos os efeitos sociológicos, psicológicos e espirituais que estão a produzir. A família tem-se transformado em laboratório para estudo e reflexão. Os próprios familiares servem de cobaias, só que os produtores dos programas se encontram a quilômetro de distância e não se dão conta do que acontece no interior da cada família.
Cabe a pais e filhos, mestres e alunos dialogarem sobre o impacto da mídia sobre as relações internas da família, sobre o processo pessoal de cada membro com as chances e riscos, benefícios e limites, riqueza e empobrecimento.
Hoje já não soa nenhum discurso moralista. O primeiro passo tem de ser um olhar analítico que levante os dados com a maior objetividade possível em tema extremamente envolvente da subjetividade. Necessitamos escolher uma grade de perguntas, de inquietações, de hipóteses, de suspeitas para orientar a coleta de dados. Não tem sentido na limpa Suíça pesquisar o contágio da dengue, como nas águas sujas de rios urbanos inquirir sobre as possibilidades de criar salmão. As suspeitas brotam de experiências, de observações, de intuições.
Paira sobre a relação mídia e família a interrogação de que a primeira modifica radicalmente a vida interna da segunda com graves conseqüências afetivas, psíquicas e espirituais. Compete-nos buscar compreender essas transformações, barrando o processo cancerígeno dos tecidos familiares e criando novos antídotos. Em termos concretos, como impedir que a entrada da mídia nas famílias em escala incontrolável dificulte ou até mesmo impeça as relações entre seus membros? E doutro lado, como transformá-la em fator cultural de maior contacto e cuidado entre as pessoas? Questões que nos esperam. Uma política educacional popular e aberta deve discutir essas e outras questões similares com os educadores e famílias.
Fonte: http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=1597